Candomblés Urbanos em Expansão

I Congresso Municipal de Religiosidade Afro-brasileira

Belém/PA em 09/2002

Nesta minha breve comunicação, procuro concentrar minha dupla experiência: de um lado como sacerdote à frente de uma casa totalmente voltada ao culto, há vinte e cinco anos, e de outro lado como coordenador do Instituto Nacional da Tradição e Cultura Afro-Brasileira (INTECAB) sessão Pará, como pesquisador e observador.

No campo vasto dessas minhas experiências, vários fatores chamaram minha atenção quando um antropólogo amigo meu me perguntara se o Candomblé Ketú no Pará estava em expansão, a princípio fiquei confuso, depois me refiz e respondi-lhe que sim, porém com restrições, porque sabemos que o grande pólo difusor se concentra na Bahia, que durante anos vem se espalhando no Brasil inteiro e que felizmente chega ao norte se arrastando a duras penas.

Hoje porém, a regente expansão do candomblé Ketú no Pará envolve forte adesão de seguimentos sociais diferentes daqueles em que se originou no estado, a religião dos Orixá, com a inclusão de adeptos, não necessariamente de origem negra e que são provenientes de camadas sociais com maior escolaridade e habituadas a outro tipo de informações, isso tem dado mais credibilidade, pois antes, a religião era tida como religião de negros e analfabetos.

Buscar a legitimação do culto através do candomblé, certamente seria muito difícil em Belém, porque a aceitação é precária, por conta da cultura que é extremamente marcada pela cultura indígena, dificultando o idioma yorubá que é uma língua difícil se não praticada e coloca uma distância muito grande no quotidiano dos que querem professar o candomblé, não é o caso da mina nagô que quase todo o ritual é cantado em português, facilitando assim sua estada centenária quem sabe até milenar. O privilegiado candomblé bahiano representa o modelo típico de candomblé no Brasil, onde se firmou a tradição africana mais pura e legitimou sua posição independente, anulando assim muitos tabus antigos que às vezes chegam a confundir com criações adversas ao culto.

Outro aspecto que dificulta a expansão do candomblé é o espaço físico de uma casa de culto que deve ser bem estruturado e com condições para abrigar uma infinidade de compartimentos sagrados, como também os cargos que ocupam dentro da casa os adeptos escolhidos pelos Orixá, como por exemplo as ekeji, axogun, alabe, iya basé, etc. que são ocupações muito sérias e que toma um tempo enorme de quem se propõe, e, para que haja rito precisa-se dessa estrutura requerida.

A mão de obra do sacerdote é cara, mas às vezes tem alguns que não cobram, porém o material necessário é escasso, porque não temos em Belém ainda uma casa abalizada para a venda desse material sagrado, optando assim por importá-los e assim gastando-se mais. A ervanaria é outra dificuldade, pois algumas ervas de maior fundamento não se encontram aqui, se algumas casas possuem, são sempre trazidas de outras terras.

Quando uma pessoa que já tem casa aberta quer se iniciar no candomblé Ketú, encontra muitas barreiras, a começar com os filhos de santo (omo orixá) que não aceitam a mudança e se afastam. Outra coisa muito forte é o sincretismo que muitas vezes é confundido e comparado ao catolicismo; porém se formos muito fundo nos questionamentos, nos arriscamos a perder popularidade e credibilidade por parte dos adeptos e ainda por cima correr o risco de não conseguir perante a sociedade um reconhecimento. Temos também a questão do caboclo que já se manifestava no médium que a princípio não aceita ser colocado de lado, principalmente no período iniciático que tem que passar por muitos processos de fundamento, para que o caboclo possa se manifestar, só a partir da obrigação de ano e isso porque aqui já se abriu precedente, pois o certo é só após três anos; muitos caboclos não vêm mais naquele médium, outros conseguem se ''adequar'' às normas impostas a partir dali, se o sacerdote é persistente e não quer que seu caboclo se afaste começa uma maratona de oferendas e pedidos para que o mesmo permaneça. Me coloco como exemplo, porque tive que construir além do templo para os Orixá e um outro para os caboclos para que eles se sentissem mais à vontade, então implica aí mais gastos sem contar com o espaço religioso que se agiganta dando mais despesa e mão-de-obra.

Candomblé no Pará
  • Como observador, me chama muita atenção o fato dos caboclos de candomblé se vestirem com penachos, cocares, tangas feitas de penas e ainda usam arco e flexa se juremeiros, os boiadeiros com casacos de couro, chapéu, facão, berrantes, etc. e dançam descalços, e não se vê isso na umbanda ou na mina, que ainda se dizendo caboclos de penas não as usam. Vai aqui apenas o termo de comparação e não de crítica, pois acho isso um aspecto muito forte da tradição dos caboclos.


    Os preceitos são muito rígidos e alguns adeptos não os querem respeitar, causando assim um mal estar muito grande entre o sacerdote e o omo orixá, que já está acostumado a outro segmento que não requer tanto sacrifício, esse também é um outro ponto importante, muitas vezes levando pessoas a desistirem de seguir o candomblé.


    O Pará tem bastante espaço para essa grande diversidade afro religiosa, porém sempre presente a mina e a umbanda e principalmente no interior do estado onde o candomblé Ketú não foi adiante por todas essas dificuldades que relatei. Santarém talvez tenha sido, depois de Belém a maior concentração de candomblé Ketú com mais ou menos quatro casas abertas.


    A partir dos anos noventa já se pode dizer que Belém se firmou com trinta e poucas casas de candomblé Ketú. Daí a necessidade de apoio da comunidade afro-religiosa que aderiu ao seguimento do candomblé, para que se continue levantando a belíssima bandeira de KETÚ.


    OBRIGADO!