Convivência Religiosa Macapá/AP em 04/2003
A cada reunião de sacerdotes afro-religiosos, seja de que opção forem, sempre ouvimos a palavra ''UNIÃO''. Como se a intolerância, o preconceito e sermos olhados como desiguais, fossem desaparecer se nos ''uníssemos''. Ainda não consegui entender essa mágica, esse milagre que fará nossos problemas desaparecerem e que nossos irmãos estivessem à espera desse acontecimento esplendoroso.
Nossas crenças são tão díspares, que jamais nos uniremos. Todos nós temos anseios religiosos diferentes, por isso existem aqueles que acreditam na religião quando o retorno é imediato, de preferência com bens materiais aos que em sete anos de afro-religiosidade frequentam muitas casas diferentes e saíram falando mal de todas; até aqueles que são sacerdotes porque creem de coração no que fazem e na sua religião. E todos acham que a união vai resolver tudo com a maior rapidez. Eu pergunto a todos; - QUE UNIÃO?
Os umbandistas que tem transes de caboclos, guias, pretos velhos, irão comungar com os tradicionalistas Yorubás que cultuam um único Orixá na cabeça? Os que praticam Candomblé Jeje e os que preferem o candomblé angola, irão admitir que seus Voduns ou Nkise são a mesma energia que os orixá? E o povo de mina, com seus encantados e o povo do fundo, irão aceitar as críticas que temos ouvido sobre eles? O povo de Ketú e os tradicionalistas irão permitir que Exu seja tratado por certos setores de umbanda como espíritos atrasados que precisam ser doutrinados? E os seguidores do angola que acusam os de ketú de formar uma ''nagocracia'', mas se afirmam filhos de Ogun ou de Oxun? E os jeje que acham que o correto é se fecharem cada vez mais, e com isso estão fazendo com que os antigos templos acabem? Os tradicionalistas irão admitir que seus Deuses sejam louvados de uma forma sincrética? Os poucos sacerdotes de Egungun irão tolerar que atribuam seus problemas imediatos a um encosto de egun? Os Ketú descerão de seu pedestal e respeitarão os umbandistas como sacerdotes irmãos?
Como poderão tantos religiosos de tão diferentes caminhos se unirem? Mesmo levando em conta os inimigos que temos em comum, a mesma afro-descendência, o mesmo amos aos Deuses e ancestrais africanos ou brasileiros, a amizade que por vezes unem sacerdotes de diferentes facções, os laços familiares, os casamentos, congressos, eventos, simpósios e seminários conjuntos, ainda somos uma mixórdia das religiões que convivem no mesmo espaço.